A felicidade é muito particular. Particular nela mesma por sua raridade e peculiaridade. Particular, ao mesmo tempo, por ser relativa para cada um. Estou me considerando feliz agora por ter diarréia.
Essa relatividade é tão particular também pois algo que te traz felicidade pode se tornar algo que de traz sensação de desespero e pior, desamparo.
A diarréia pode ser desesperadora, mas não o é quando comparada ao sintoma de uma doença e não de outra.
Felicidade pode ser sinônimo de alívio também. Ausência de estresse, um final de semana tranquilo.
Ao mesmo tempo que passageira, a felicidade pode durar quando se pratica gratidão. Eu sei, é meio piegas entrar nesse quesito, mas é verdade. Sinto que vivo tão ingrata ultimamente uma vez que minha vida está apenas começando a entrar nos eixos. Não é porque "tudo está fora de lugar" que eu deveria me deixar sentir desesperada. Entre o desespero e o alívio, há o entendimento do que te desespera - e como lidar com isso. Talvez nem tudo esteja fora de lugar, talvez algumas coisas apenas estejam no lugar errado, na ordem errada. Por exemplo, eu sei que quando não faço o que gosto, no caso, criar (textos, colagens, músicas) e rir, assistir One Three Hill, dar aula para minha aluna preferida, me sinto desanimada e fora do lugar porque eu preciso estar em primeiro, não certas preocupações como "vou conseguir arrumar um trabalho legal ano que vem?". Não que essa preocupação não seja legítima, mas ela não deve estar acima do meu dever de ser feliz em primeiro lugar. E é aí onde o desespero pode esperar na fila, porque eu não preciso me preocupar tanto com dinheiro agora. Eu ainda estou num processo de adaptação a minha nova realidade, seja esta o fato de ter me tornado adulta meio sem perceber.
No interím da adultice, moram novas preocupações e até não deixar que elas se tornem motivo de desespero, demora um pouco. Não é que demora, é que criamos a expectava de que seja rápido, sem oscilação, um mar tranquilo. Quando diabos o mar é tranquilo? Se essa metáfora está sendo usada aqui, é justamente porque o mar não é sempre tranquilo. Somos navegantes sem experiência e pouco sabemos sobre o mar. Por que esperamos que não haverão ondas, trovões, alguns afogamentos talvez e o tão subestimado inesperado?
A vida é inesperada. A maioria das situações da vida não é como esperamos e precisamos nos lembrar disso todos os dias para que o desespero não esteja no leme.
Estou com diarréia, mas também não estou com câncer. Estou com diarréia, mas não estou num relacionamento de merda. Estou com diarréia, mas não estou sem teto. Estou com diarréia, mas minha geladeira não está vazia. Estou com diarréia, mas minhas mãos não estão vazias. Estou com diarréia, mas não estou desamparada. Estou com diarréia, mas não estou sem amigos.
Pela perspectiva da diarréia, sou lembrada de que as coisas estão como são: imprevisíveis.
Me sinto feliz por tê-la como lembrete de que é só uma diarréia. Nada mais, nada menos.